quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

As causas da pobreza no Nordeste

Artigo – Jornal O Povo


José Lemos - Demartone Coelho Botelho
03 Fev 2010

As regiões pobres têm uma baixa capacidade de atração de empreendimentos dos setores de transformação e de serviços devido ao reduzido poder de compra a que está submetida a grande maioria das populações nelas residentes.

Como os setores de transformação e de serviços exigem um nível de melhor de qualificação de mão-de-obra, o excedente de força de trabalho que migra das áreas rurais para as áreas urbanas das cidades tem dificuldade de encontrar alocação nos trabalhos que aí são oferecidos. Assim, as atividades agrícolas desempenham um papel estratégico para o Nordeste. Se for promovido o desenvolvimento rural estarão sendo criados os instrumentos que viabilizarão a permanência voluntária das famílias nas zonas rurais da região.

Um fator complicador para a produção agrícola no Nordeste é a irregularidade, temporal e espacial, das precipitações de chuvas, além da prevalência de solos de aptidão restrita para lavouras, decorrente, em parte, de uma elevada depredação da base dos recursos naturais que já é nítido em áreas extensas da região.

Nos municípios inseridos no semiárido as dificuldades associadas à produção agrícola se ampliam em relação às possibilidades que têm as demais áreas do Nordeste, cuja maior dificuldade é o atraso tecnológico. Por causa das irregularidades associadas aos regimes pluviométricos em que há intermitência anual de escassez ou excesso de chuvas, torna-se mais difícil a vida nessas áreas. Desenhar ações que viabilizem a convivência com a incerteza hídrica se constitui num grande desafio. Vale ressaltar que parte da escassez de produção e da capacidade de sustentação da vida animal e vegetal, nessas áreas, decorre da ação humana, e se constitui a um só tempo em causa e consequência da pobreza rural.

Isto se dá em decorrência da transformação de grandes áreas de onde é retirada a cobertura vegetal natural para a inserção de pastagens ou de culturas exóticas não adaptadas ao ambiente, que também exaure o recurso natural solo de forma acelerada. Uma das consequências previsíveis dessa sinergia de ações será o desaparecimento gradativo dos corpos aquáticos naturais de superfície.

Tomando o Ceará como referência, observa-se que entre 1947 e 2008 a média da precipitação de chuvas foi de 869 milímetros, com amplitude variando de 309 a 1.888 milímetros. Naquele período a produção agregada de alimentos, que é predominantemente realizada por agricultores familiares, oscilou de 406 mil toneladas a 1,44 mil toneladas. A produção diária per capita de alimentos foi de 840 gramas, mas oscilou entre 250 gramas e 1.840 gramas. Portanto, as atividades agrícolas, que não utilizam tecnologias que independem do regime pluviométrico, têm elevados riscos no Estado.

Acrescentem-se ainda o fato de terem terras em tamanho e fertilidade inadequados à sustentação das famílias. Essas dificuldades induzem os agricultores familiares a práticas agrícolas que exaurem os recursos naturais. Essa sinergia de eventos provoca o empobrecimento desses recursos e das famílias que se tornam potenciais emigrantes. Forma-se um ciclo de pobreza que é difícil, mas que precisa ser rompido com tecnologias adequadas, com políticas de acesso aos ativos produtivos e sociais. Sem isso os nordestinos continuarão emigrando às cegas. Na perspectiva de que pior não pode ficar.

José Lemos - Professor associado na Universidade Federal do Ceará.

Demartone Coelho Botelho - Economista, mestre em Economia e técnico da Universidade Federal do Ceará

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