quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Combater a Pobreza no Brasil

José Lemos*
Em seu discurso de posse a Presidente anunciou como prioridade do seu governo o combate à pobreza no Brasil. Na mensagem e em documentos que foram divulgados pela imprensa não ficaram estabelecidas metas, tão pouco de que pobreza ela estava falando.
Sim, porque o conceito de pobreza é controverso e tem diferentes interpretações e enunciados. O mais divulgado deles é a “linha de pobreza”. Por este conceito haveria uma linha imaginária de um dólar americano em que as pessoas que moram em países com elevados percentuais de carências, como o Brasil, que tiverem renda diária igual ou inferior àquele valor seriam pobres. Assim, as metas de políticas para retirar populações da pobreza, segundo esta visão, seriam aquelas que tivessem a capacidade de fazer os pobres (nesta definição) terem renda monetária superior àquele valor.
Claro que este é um conceito frágil e que não se sustenta nem mesmo numa avaliação superficial. Veja-se. Ao cambio de hoje, de aproximadamente R$1,80 / US$, quem tiver renda de R$2,00 por dia ou R$60,00 por mês teria ultrapassado a linha de pobreza. Imagine-se que para conseguir esta renda a pessoa tenha que pagar duas passagens de transporte coletivo (uma para ir e outra para voltar do trabalho) com custo unitário de R$2,05 como acontece em São Luis, Maranhão. Imagine-se que esta pessoa resida como provavelmente acontecerá, em bairro que não é servido pela rede de água encanada. Imagine-se ainda que tenha filhos em idade escolar e os colégios não estejam como normalmente acontece, em área próxima à sua precária residência. De sorte que as crianças ou precisam de transporte ou terão que ir caminhando para a escola percorrendo longos trechos. A pergunta que fica é: este cidadão pode ser considerado como não pobre”?
Na nossa avaliação, o conceito de pobreza é bem mais amplo do que o mero acesso à renda monetária que é um dos seus componentes, mas não o único. Uma forma mais abrangente de contabilizar os pobres, nesta visão, seria contar a população que, além de não ter um padrão mínimo de renda monetária, não tenha acesso aos serviços essenciais que deveriam ser providos pelo estado como: água encanada, saneamento, coleta sistemática de lixo, educação, moradia, segurança e saúde, principalmente.
Foi com esta perspectiva que construímos o Índice de Exclusão Social (IES) que incorpora as privações daqueles ativos sociais e da renda entre os seus indicadores. Através dele objetiva-se ter informações da real situação de privações em que vivem as pessoas nos seus domicílios particulares (próprios ou não).
O Banco do Nordeste, que edita o livro já na sua terceira edição, onde consta o mapeamento de todos os municípios e estados brasileiros com previsões até 2010 daqueles indicadores de privações, disponibilizou para a Presidente e sua equipe uma versão preliminar do trabalho. Uma contribuição modesta cuja única pretensão é a tentativa de ajudar a planejar a reversão dos indicadores dramáticos que estão mostrados no livro.
Talvez uma boa estratégia para reduzir os atuais níveis de pobreza, entendidos numa visão mais abrangente, é estabelecer metas. O então Governador do Maranhão, José Reinaldo (2002-2006), conseguiu resultados expressivos criando metas para o final de seu governo. A partir delas as energias e sinergias de toda a sua equipe tinham aqueles objetivos. Os resultados foram expressivos, haja vista que em dezembro de 2006 o Maranhão deu saltos qualitativos em todos os indicadores sociais e econômicos, e saiu da incômoda posição de Estado mais carente do Brasil., inclusive recuperando a sua maior vocação que é a produção de alimentos que havia entrado em colapso nos anos noventa.
Um indicador importante de pobreza é o elevado percentual da população analfabeta maior de dez (10) anos, e a baixa escolaridade média da população brasileira, sobretudo daquela que sobrevive nas regiões mais pobres. Assim, o governo poderia estabelecer como meta reduzir a atual taxa de analfabetismo de maiores de dez (10) anos dos atuais 10% para no máximo 5% ao final de 2014. Na nova edição do nosso livro estima-se que a taxa de desaceleração do analfabetismo no Brasil entre 2001 e 2008 foi de apenas 0,4% ao ano. Seria o caso de fazer esta taxa crescer para pelo menos um por cento (1%) ao ano, através de um mutirão para alfabetizar adultos, elevar a taxa de matriculas de crianças e adolescentes em escolas de melhor qualidade. Além disso, a escolaridade média, que atualmente é de 7,8 anos, deveria crescer para pelo menos 10 anos até 2014. Para tanto a taxa de aceleração deste indicador deveria saltar dos atuais 3,5% ao ano (2001/2008) para pelo menos 7% ao ano no período 2011/2014.
Reduzir percentual de analfabetos e incrementar a escolaridade média se conquista, não apenas com a necessária multiplicação do número de salas de aula em condições adequadas, mas também com mais professores melhores qualificados e bem remunerados, disponibilidade de bibliotecas com acervo atualizado em quantidade e qualidade, além da merenda escolar que deve ser regionalizada ou municipalizada.
Merenda escolar regionalizada implica na aquisição dos alimentos no próprio município, ou no seu entorno. Isso provoca incremento da produção agrícola municipal e regional, implicando na elevação da renda monetária do setor rural. Vale lembrar que estão nas áreas rurais os maiores bolsões de pobreza do País.
Além das providencias essenciais na educação, as famílias precisam ter acesso aos ativos sociais como: água encanada, saneamento e coleta sistemática de lixo. Esses três elementos atuam como medicina preventiva, o que reduzirá a necessidade de gastos posteriores com medicina curativa. Providencias que proporcionam vida longa e saudável.
A renda monetária nas áreas rurais pode ainda avançar priorizando a produção agrícola familiar, garantindo-lhe assistência técnica gratuita, credito rural, seguro safra, preços mínimos remuneradores, infra-instrutoras de armazenamento e de escoamento.
Nas áreas urbanas, uma população com maior nível de escolaridade irá conquistar melhores espaços para auferir renda maior, como assalariado, ou como dona de seus negócios. Assim, programas como o “Bolsa Família” tornam-se emergenciais (como devem ser as transferências de renda) voltados para atender casos extremos e com período definido de tempo. A dinâmica que se impõe através de medidas assim terá efeitos multiplicadores ou externalidades positivas tanto de um ponto de vista econômico, como social e ambiental.
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*Professor Associado na Universidade Federal do Ceará. Autor do Livro “Mapa da Exclusão Social: Radiografia de Um País Assimetricamente Pobre” com a Terceira Edição no Prelo da Editora do Banco do Nordeste do Brasil. www.lemos.pro.br

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