sábado, 11 de junho de 2011

Crise Alimentar no Mundo

José Lemos*

Um tema atual na conjuntura mundial é a crise de escassez relativa de alimentos e o conseqüente encarecimento desses itens em praticamente todos os continentes. A maior conseqüência da falta de alimentos será o agravamento do quadro atual de famintos no mundo estimados pela ONU proximamente em um bilhão de pessoas. Este item é o de maior peso econômico na cesta de bens das famílias mais pobres. Aliás, esta é uma das formas de aferição de pobreza: verificar o peso dos itens alimentares no orçamento familiar. Os pobres usam quase toda a renda consumindo esses gêneros.
Uma combinação perversa de fatores conjunturais está no âmago dos problemas que provocam o encarecimento atual dos alimentos. Dentre esses fatores destaca-se o crescimento da demanda em paises como China, Índia, Brasil e outros países emergentes do mundo. A demanda mundial de alimentos nos últimos anos cresce a uma taxa média anual de aceleração de 7%. Na Índia e na China vive um terço da população do mundo. Apenas nesses dois países, 7% de crescimento anual de demanda significam a incorporação de aproximadamente 190 milhões a mais de gente pressionando por mais comida no ano. Incorpore-se a essa contingente as populações dos demais paises (Brasil no meio deles) demandando comida em escala ascendente, em decorrência de melhoria de renda.
Estima-se que para produzir um quilograma de calorias de carne são necessários ao menos sete quilogramas de calorias provenientes de rações. Os principais ingredientes das rações são os grãos de soja, milho e sorgo. Isso sem falar nas imensas áreas de pastos necessárias para a manutenção do gado bovino. Em condições favoráveis, é necessário um hectare de pastagens para cada unidade de bovino para corte. Assim, a combinação de demanda crescente por comida, com a baixa capacidade de resposta no curto prazo (a produção agrícola é sazonal), causa a escassez de alimentos no mundo.
A crise que afeta o preço do petróleo, que já ultrapassou os US$ 120,00 por barril, a desvalorização do dólar em relação às moedas conversíveis no mundo, se constituem noutro conjunto de fatores que afeta os preços dos alimentos. Isto porque o petróleo entra como principal fonte de energia para o transporte da produção agrícola. Além disso, o petróleo também entra na composição dos insumos utilizados na agricultura em geral e na que produz alimentos em especial, sob a forma de combustíveis e lubrificantes usados nos tratores e máquinas agrícolas, agroquimicos como praguicidas em geral, além de fertilizantes. O seu encarecimento tornará o alimento mais caro no varejo.
Não bastassem todos esses fatores, paises como a Austrália, grande produtora de grãos e carnes no mundo, passam por dificuldades climáticas que afetam as respectivas produções de bens agrícolas. Adicionalmente os paises ricos subsidiam a produção interna de alimentos, o que inviabiliza a competição internacional dos paises pobres, que tem na produção agrícola o seu principal item de vantagens comparativas tal como ensinado por David Ricardo. Completando o ciclo, os países ricos também estão subsidiando os seus agricultores para cultivarem os produtos destinados à produção de bioenergia. Isso tem levado à substituição de áreas antes destinadas à produção de alimentos para os cultivos de produtos agro-energéticos. Os Estados Unidos utilizam o milho na produção de etanol para substituir parte do petróleo consumido naquele País, que é o maior demandador mundial de energia. Em 2006 16% das terras agricultáveis americanas foram destinadas à produção de milho para transformar-se em álcool. Para 2011 a projeção é que ao menos 30% da produção de milho nos EUA sejam transformados em etanol.
A produção de álcool a partir do milho não tem eficiência econômica se comparada à produção a partir da cana-de-açúcar. Portanto, estamos diante de um grande paradoxo: justamente o País que lidera o capitalismo, que tem no liberalismo econômico e nas leis de mercado os seus fundamentos, utiliza instrumentos que dificultam essas leis de mercado, assim como o liberalismo e premiam as ineficiências técnica e econômica. Sem dúvida um importante determinante para que haja escassez de alimentos no mundo.


*Professor Associado na Universidade Federal do Ceará.


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