segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Estupidez


Poderia ter muitas mais, tal é a abundância e a quantidade de disfarces que ela assume. Embora reconheça a utilidade do Citador, devo começar por esclarecer: nenhuma das frases a seguir transcritas provém desse lote. Foram laboriosa e dedicadamente compiladas ao longo de anos, com uma obstinação – e contra mim falo – a roçar a estupidez…
A primeira frase é atribuída a alguém em teoria muito pouco habilitado para falar sobre estupidez. Porquê? Porque se tratava de um génio – Albert Einstein. O pai da teoria da relatividade disse um dia: «Existem apenas duas coisas infinitas: o Universo e a estupidez humana. E não tenho tanta certeza quanto ao universo». Sucinta como uma fórmula matemática, esta afirmação coloca em paralelo dois grandes desconhecidos: a mente humana e o universo.
Já o cineasta Claude Chabrol disse algo muito idêntico, mas com outras nuances: «A estupidez é infinitamente mais fascinante que a inteligência; a inteligência tem os seus limites, a estupidez não». Mas o que é afinal a estupidez? Einstein e Chabrol dizem que não tem limites, mas ninguém duvida que é uma limitação e uma ausência – de inteligência, de cultura, de horizontes, de consciência (alguém consciente da sua própria estupidez deixaria de ser estúpido).
Socorramo-nos de uma expressão muito popular: ‘estúpido que nem um porta’. Talvez esteja enganado, mas acredito que o cerne da questão aqui não é as portas serem estúpidas – ou pelo menos mais estúpidas do que as janelas, as pedras ou os telhados. O que a expressão evidencia é que falar com certas pessoas (os ditos estúpidos) é tão útil como avançar contra uma porta fechada. Por mais que se tente, não se consegue progredir.
No conto Civilização, que é uma deliciosa sátira do progresso e um elogio da simplicidade, Eça de Queiroz deita mais uma acha para a fogueira: «Assim se achava formidavelmente abastecido o meu amigo Jacinto de todas as obras essenciais da inteligência – e mesmo da estupidez». Temos a ideia de que os livros são os fiéis depositários da sabedoria, mas Eça, com o seu veneno e a sua abertura de espírito, mostrou que nem eles estão imunes ao contágio da estupidez humana.
Há tempos li uma entrevista que me deixou intrigado. Nela, uma personalidade muito respeitada da nossa praça dizia com todas as letras: «80% das pessoas são estúpidas» (os meus caros leitores podem estar descansados porque felizmente fazem parte dos outros 20%). Talvez seja verdade. Mas é preciso dar o desconto. Tal como todos temos os nossos momentos de brilhantismo, também os temos de estupidez. O que não faz de nós pessoas permanente e irremediavelmente estúpidas. Como notou Denis Diderot, um dos autores da Enciclopédia, «não é o fato de ter sido estúpido algumas vezes que faz de mim uma pessoa estúpida». Quem somos nós para o contrariar?



José Cabrita Saraiva


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