Na
verdadeira amizade, em que sou experimentado, dou-me mais ao meu amigo que o
puxo para mim. Não só prefiro fazer-lhe bem a que ele mo faça mas ainda que ele
o faça a si próprio a que mo faça; faz-me ele, então, o maior bem possível
quando a si o faz. E se a sua ausência lhe for quer prazenteira quer útil,
torna-se-me ela bem mais agradável que a sua presença; e de resto não é
propriamente ausência se há meios de comunicarmos um com o outro. Tirei outrora
partido e proveito do nosso afastamento. Em nos separando, melhor e mais
amplamente entrávamos em posse da vida: ele vivia, fruía e via para mim, e eu
para ele, mais plenamente que se ele estivesse presente. Uma parte de cada um
de nós permanecia desocupada quando estávamos juntos: fundíamo-nos num só. A separação
espacial tornava mais rica a união das nossas vontades. A insaciável fome da
presença física denuncia uma certa fraqueza na fruição mútua das almas.
Michel de
Montaigne
*
Nenhum comentário:
Postar um comentário